Vocalista do Adão Negro diz que sociedade está mais atenta ao racismo: "Povo tem mais consciência de si"

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Luiz Felipe Fernandez

Entretenimento

18 de fevereiro de 2022 às 17h00

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Consolidado como um dos nomes de maior sucesso no reggae na Bahia e no Brasil, o cantor Serginho Cassiano, do Adão Negro, carrega consigo e na banda a proposta do "diálogo" e da aceitação, sem perder ao longo dos anos, o tom da crítica social de suas músicas. São quase três décadas na estrada e, apesar de ainda hoje conviver com cenas como o espancamento de Möise Kabagambe e o retorno do nazismo como pauta, ele vê avanços de um povo hoje mais consciente de si.

"Acho que muita coisa tem mudado. A juventude já nasce com essa perspectiva de ter consciência que existe um discurso hegemônico, de massacre a uma cultura, uma estética. O povo agora já tem mais consciência de si", disse Serginho, em entrevista ao Portal Salvador FM

No último sábado (12), o cantor recebeu em seu camarim a visita de personalidades pretas como Negra Jhô, liderança religiosa e renomada artista de tranças e turbantes que ganhou recentemente a honraria de Doutora Honoris Causa, DJ Branco, lenda do hip-hop baiano, e João Jorge, intelectual fundador do Bloco Olodum. Para Serginho, são figuras que carregam representatividade a abriram caminhos para uma realidade diferente.

"É devagar, mas temos ocupado espaços de poder que ainda são novidades. É um trabalho de formiga, mas acredito que a gente tem avançado neste sentido, de autopercepção, autovalorização, de visão de mundo. Isso começou com João Jorge, Vovô do Ilê, gente que veio antes deles. Sinto que hoje estamos em outro momento, como a rapaziada dos 'Racionais' [grupo de rap liderado por Mano Brown] profetizou: Que ironia, seu filho quer ser preto'. Isso sinaliza para mim que a gente tem um novo olhar", analisa o compositor de clássicos como "Bota Um", "Anjo Bom" e "Eu Louvei".

Sem estar alheio ao "momento de radicalização" incentivado pelo governo Bolsonaro, Serginho reconhece que hoje ao menos já existe uma reação da "sociedade", como no caso do ex-apresentador do Flow Podcast, Monark, demitido após defender o direito de criação de um paritdo nazissta. 

"Hoje já temos uma resposta da sociedade, como aconteceu com o Monark. Se é a melhor, eu não sei, mas é uma resposta", pondera.

"Vemos coisas bizarras acontecendo, mas temos motivos para acreditar que o que João Jorge militou, encontra eco nas novas gerações", completa Serginho.

Uma das representantes dessa nova geração que bebe diretamente na fonte de estudiosos pretos é Bárbara Carine (dona da página @uma_intelectual_diferentona) , que já tem compromisso marcado como convidada do Bahiacast, podcast apresentado por Serginho que ganhou força e notoriedade dos últimos meses.

O programa é a readaptação da linguagem desenvolvida pelos integrantes do Adão Negro e que se constituiu no novo desafio para a carreira do cantor. 

"O Bahiacast nasce dessa necessidade de abrir a mente, de continuar a militância nos palcos, de buscar o diálogo e discutir diferentes visões de mundo, que são muitas", relata, lembrando a participação da banda de pagode A Travestis no podcast. "Me ensinou a usar corretamente o pronome", recorda.

Enfrentando todas as dificuldades pelo Adão Negro, que classifica como "um patinho feio" na música brasileira, sendo "mainstream" demais para ser considerado "raiz", e vice-versa, Serginho diz que o Bahiacast te trouxe experiências que não podem ser mensuradas pelo possível retorno financeiro que o projeto te dê. 

"O podcast não me deu respostas, mas me ensinou a fazer algumas perguntas que eu jamais faria se não tivesse a experiência de conversar com pessoas de perspectivas diferentes. Se você não tenta nada novo, você também não vai aprender nada. O maior ganho nisso para mim, não é qualquer ganho financeiro, que já é uma perspectiva bastante palpável, mas de aprender e ressignificar o mundo", finaliza.

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